Ora, todos quantos querem viver piedosamente em Cristo Jesus
serão perseguidos. 2 Timóteo 3:12.
Tem gente que sofre de mania de perseguição. Percebe
fantasma em tudo. - Está todo mundo na moita para me assaltar. As sombras da
importunação rondam no encalço da pessoa, o tempo todo. Há sempre uma nuvem
escura cobrindo o seu território. Gaviões invisíveis sobrevoam, em manobras
rasantes, apavorando o ninho. Gente com mania de perseguição sofre de uma
invasão permanente de domicílio. Por todos os lados, se sente acossada pelo
espectro perseguidor. A mania de perseguição é uma enfermidade da alma insegura,
que se vê ameaçada constantemente com as assombrações. Não é fácil exorcizar o
pavor que se instala na mania de perseguição, pois sua tendência a Sherlock
Holmes acaba enxergando detalhes que só detetives experientes são capazes de
espionar.
Por outro lado, há, neste mundo, muita gente que procura ser
perseguida. São vítimas da história, estigmatizadas na alma, que assumem o
papel de refém da provocação. Mesmo quando tudo vai bem, elas desafiam os
outros, para causar motivos de serem atormentadas. Há uma sensação de
inconformidade assanhando a represália. As pessoas que sofrem deste
desequilíbrio gostam de vitimar-se, insultando os sentimentos de perseguição.
Elas vivem estimulando, ainda que inconscientemente, situações que resultem em
vingança ou desforra, para que se configurem no quadro da persecução. As dores
de uma alma ferida sempre aparecem nos mecanismos mais inesperados de um
comportamento doentio como este. Pessoas assim, viciadas em paixões que
danificam os outros, picam, e, sutilmente, injetam o veneno insinuante, para se
sentirem perseguidas com as reações.
Mas há um terceiro tipo de perseguido apresentado pela
Bíblia. Não se trata de uma pessoa assombrada, que vê visagem, nem aquele que
precisa satisfazer os incômodos de seus sentimentos com as desculpas do
vitimismo. A perseguição aqui tem uma razão: Alguém quer viver piedosamente em
Cristo Jesus. A vida de santidade incomoda profundamente o homem carnal. Não há
nada mais que possa azedar uma alma medíocre do que a inveja por causa da
pureza de coração. O andar com Deus em santidade atrai marimbondos. John Flavel
pontuava: Quem é mais inocente do que Cristo? E quem é mais perseguido? O mundo
continua sendo o mesmo. A madrasta da Branca de Neve sofria do mal do espelho.
A cobiça não suporta alguém mais... do que eu. Não podia aceitar que a sua
enteada fosse mais bonita do que ela. A maçã envenenada é a marca da emulação.
Mas os judeus instigaram as mulheres piedosas de alta posição e os principais
da cidade e levantaram perseguição contra Paulo e Barnabé, expulsando-os do seu
território. Atos 13:50. Esta piedade legalista, esculpida com o cinzel dos
méritos, não consegue aceitar a piedade em Cristo. A religião moralista tem uma
aversão terrível ao Evangelho da graça de Deus. O postiço se incomoda tremendamente
com o legítimo. Ninguém pode insultar tanto um religioso como aquele que
depende totalmente da suficiência de Cristo. Mas neste caso, a perseguição é um
dos sinais mais seguros da autenticidade do Evangelho da graça de Cristo. Os
seguidores de Cristo não podem esperar melhor tratamento do mundo do que o que
o Mestre recebeu, insistia Matthew Henry.
No cristianismo, ser perseguido pelas razões corretas é um
privilégio. Se há uma coisa que deve nos preocupar é a falta de perseguição.
Não estamos falando da perseguição fruto das provocações, mas do contraste
causado pela vida de Cristo. Não é possível ser um cristão verdadeiro e não
causar antipatia naqueles que são falsos. Todos aqueles que diplomaticamente
fazem acordos com os sistemas do mundo e que defendem seus direitos na base das
concessões vantajosas não podem entender a simplicidade dos que dependem
absolutamente da obra de Cristo. Todos os que querem ostentar-se na carne,
esses vos constrangem a vos circuncidardes, somente para não serem perseguidos
por causa da cruz de Cristo. Gálatas 6:12. A licença, aqui, está voltada para o
lucro. É preferível acomodar a ser incomodado. Os privilégios sempre abaixam os
valores. Mas o cristianismo autêntico carrega, em sua essência, a semente do
incômodo. Naturalmente ele vai transtornar o estilo de vida do pecador, sem
qualquer insulto ou ataque.
O cristianismo da cruz é muito radical. Não é fanático ou
intransigente, mas é inconciliável com qualquer outro sistema de salvação.
Jesus Cristo crucificado e ressurreto é incombinável com todos os meios
salvíficos apresentados pelos homens. John Stott mostra que, nada provoca tanto
a oposição do mundo como o Evangelho de Jesus Cristo. Isto porque ele enfatiza
certas doutrinas desagradáveis, como a gravidade do pecado humano, a realidade
da ira e do juízo de Deus, a impossibilidade de auto-salvação, a necessidade
fundamental da cruz, a dádiva graciosa da vida eterna e os perigos da morte
eterna. Estas verdades minam o orgulho humano e incitam a oposição humana. Assim,
os pregadores são tentados a silenciá-las, para não serem perseguidos por causa
da cruz de Cristo. O radicalismo da singularidade e suficiência de Cristo
desperta resistência contra os cristãos, produzindo a evaporação daqueles
superficiais que se apavoram com o estalido do chicote. Mas eles não têm raiz
em si mesmos, sendo, antes, de pouca duração; em lhes chegando a angústia ou a
perseguição por causa da palavra, logo se escandalizam. Marcos 4:17. Os rasos e
rasteiros desertam. As perseguições são benéficas para escorraçar os ratos das
despensas do palácio. Além destas vantagens de seleção, separando o joio do
trigo, a perseguição ainda realiza uma outra missão muito importante na
formação do caráter firme de um cristão genuíno. A presença divina torna os
mártires dispostos tanto a morrer quanto a jantar. Eles não se sentem
discriminados nem vítimas. Não há terremotos no interior do coração. Ainda que
não queiram os sofrimentos, não temem as mutilações. As vibrações são sempre
externas, pois, no profundo reside uma confiança inamovível. O apóstolo Paulo
deixa claro este sentimento: e nos afadigamos, trabalhando com as nossas
próprias mãos. Quando somos injuriados, bendizemos; quando perseguidos,
suportamos. 1 Coríntios 4:12. A têmpera do aço é forjada nas fornalhas, e o
caráter dos cristãos na cruz e nas perseguições. A. W. Tozer dizia que, o fogo
de Deus não pode ser apagado pelas águas da perseguição dos homens. Quanto mais
o martelo bate, mais o prego fica firme na madeira.
Nenhum cristão sadio anda com lentes de aumento procurando
os demônios da perseguição. Só a síndrome do pânico avista uma avestruz onde
pousava um mosquito. Os colecionadores dos fantasmas da perseguição são doentes
graves. Também, é caso sério quem precisa desculpar suas mazelas instigando
perseguição. Todos estes que ferroam para serem depois molestados, sofrem de
uma profunda desorganização psíquica. Mas, aqueles que são perseguidos por
causa do Evangelho, sem qualquer motivo provocante, e sem qualquer outra razão,
senão a manifestação da justiça de Cristo, devem se considerar muito felizes.
Somente os vendavais produzem música na harpa eólia. Bem-aventurados os
perseguidos por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus. Mateus 5:10.
Deste modo, viver sem perseguição não é mania de perseguição. Por isso,
precisamos perseguir a vida santa que, sem provocação, desemboca nos mares
agitados das perseguições. Os santos de Deus serão perseguidos quando
refletirem humilde e mansamente o caráter de Cristo. O discípulo não está acima
do seu mestre, nem o servo, acima do seu senhor. Basta ao discípulo ser como o
seu mestre, e ao servo, como o seu senhor. Se chamaram Belzebu ao dono da casa,
quanto mais aos seus domésticos? Mateus 10:24-25. Tão certo como 2 mais 2 são
4, os santos de Deus serão: perseguidos, porém não desamparados; abatidos,
porém não destruídos. 2 Coríntios 4:9.
Solo Deo Glória
Fonte FÉ REFORMADA
Nenhum comentário:
Postar um comentário